Tratamento de dependência química varia também conforme faixa etária

É natural imaginar que o que leva uma criança ao álcool pode não ser o mesmo conjunto de razões que faz o mesmo processo em um idoso. E, por isso mesmo, a abordagem da dependência química em cada faixa etária tende a ser diferente. Compreender individualidades ajuda no sucesso dos tratamentos.

Estas diferenças aparecem porque a motivação da pessoa não é necessariamente  a mesma, nem a fase da vida. Quando falamos com adolescentes, segundo a psicóloga Flávia Brum, é necessário abordagens participativas e dinâmicas. É um momento de desenvolvimento, aprender quem é, se descobrir e questionar regras.

 “Um adolescente, se ficar apenas falando (como na terapia), é difícil de envolvê-lo. Já um adulto se beneficia de uma conversa tranquila. Por isso o olhar é outro, de acordo com o paciente e faixa etária”, explica. Ainda entre os mais jovens, em geral são os pais que procuram ajuda, principalmente ao notar sinais como queda de desempenho escolar, afastamento da família e dos amigos e troca repentina de círculo social.

Conforme a idade avança, os sinais ficam mais sutis, mas ainda assim, o primeiro local de descoberta de um vício é dentro da própria casa. Alguns indícios que aparecem são necessidade de consumo para ter tranquilidade; gastos além do necessário com a bebida e/ou substância; não cumprir compromissos; faltas no trabalho ou mesmo aparecer sob efeito.

            No caso dos idosos aumenta a frequência de dependência alcoólica. O que é comum nesta faixa etária é a dificuldade de aceitação do diagnóstico (passei a vida bebendo e nunca tive problema, porque agora terei?); e na aposentadoria, excesso de tempo ocioso. Neste público os tratamentos em grupo tendem a funcionar melhor, para a pessoa se sentir inserida e se identificar com outros na mesma situação.

            Diferentes abordagens

            Por reconhecer a dependência como uma doença multifatorial, crônica e progressiva, as abordagens terapêuticas vão além da questão do uso da droga propriamente dito. É recorrente a dificuldade de lidar com sentimentos e com a autoestima. Ao longo do processo, o objetivo é tratar as causas que se manifestam em forma de vício e ensinar ferramentas para que o dependente saiba lidar com os gatilhos de uso.

            É feito um trabalho para que a pessoa recupere os prazeres da vida, já que com a intensificação do uso, a rotina tende a focar na substância. Apesar de não se falar em cura, podemos falar em uma vida saudável e completa, convivendo com a doença e adotando mudanças comportamentais.

            Pode-se apontar fases de motivação de tratamento: reconheço o problema, mas não estou apto a procurar um tratamento; tem a recaída, que faz parte do tratamento e não se perde tudo por causa disso. É um momento para tentar identificar quais os pontos fracos, o que levou a esta recaída, trabalhando aspectos da personalidade e história, fortalecendo e adquirindo habilidades sociais de enfrentamento; também a aceitação do problema; e colocar em prática tudo o que aprendeu.

Algo presente durante o tratamento de dependência é o incentivo à atividade física. Isto porque a droga quando consumida faz o cérebro liberar substância de sensação de prazer, que são as mesmas liberadas quando da prática de exercícios. Neste contexto, adotar este hábito é um dos fatores que ensina o organismo a encontrar prazer em outras fontes.

            “Em termos de sociedade (especialmente quando falamos sobre o álcool) existe uma estimulação coletiva, que coloca o beber no centro de alegria, felicidade, comemorações e é normalizado, mas quando vira um problema, é tratado apenas no campo individual”, contrapõe Flávia, reforçando que o tratamento envolve mais do que apenas o dependente, precisando também do apoio enquanto sociedade.

E a família, como fica?

Além do prejuízo a si mesmo, a tendência é de toda a família e pessoas próximas do dependente serem afetadas.         “A família inteira sofre, cada um de um jeito, e não tem como mensurar quem sofre mais ou menos. Mas, enquanto o dependente passa por momentos em que está anestesiado, a família passa por tudo sem anestésico”, reforça Flávia.

            No processo de tratamento a família também passa por terapia, para conscientização dos familiares sobre a situação. O dependente precisa aprender a ficar sem a substância e o papel da família é facilitar o processo. Por exemplo, nos casos de alcoólatras, evitar eventos com bebidas. Se você sabe que são os sábados à noite o problema, procure mudar a rotina deste dia e incluir atividades diferentes.

            Ainda, é preciso o entendimento que a dependência química é a manifestação de outros problemas, como questões de relacionamento e comportamento. Por isso, em geral, não apenas o dependente tem indicação por terapia, mas todos os envolvidos próximos da pessoa.

Fonte: Flávia Brum, psicóloga, CRP 18/00998